segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Gomorra



Gomorra é baseado no livro do jornalista Roberto Saviano, que esteve infiltrado na máfia italiana e resolve contar os maiores segredos do grupo. Após publicar a obra, o jornalista foi ameaçado de morte pelos mafiosos da "Comorra". Ele vive sob proteção policial 24 horas por dia desde outubro de 2006. Os desdobramentos da publicação do livro já ilustram o que o espectador pode encontrar no filme.

O diretor Mateo Garrone utiliza a estratégia do "filme-mosaico" para contar o cotidiano da máfia italiana. São varias tramas diferentes que acabam se unindo em um certo momento da produção. O perigo de realizar filmes dessa maneira é que algumas estórias acabam se tornando mais interessantes que outras, o que acarreta no cansaço dos espectadores. Se existem dois "filmes-mosaico" muito bem dirigidos e com roteiro brilhante são: "21 Gramas" (2003) e "Amores Brutos" (2000). Ao contrário desses dois, "Gomorra" peca e deixa a desejar quando se trata de ritmo.

Mas se o filme não é acelerado e chega a ser até cansativo, ele pode ser elogiado por alguns quesitos técnicos. Mateo Garrone transmite o tom documental do filme quando faz com que o espectador tenha a sensação que tudo foi filmado por alguém inexperiente, tipo "uma câmera na mão e uma idéia na cabeça". O que é bastante interessante. Outro ponto interessante foi a falta de glamour dos mafiosos. Contrariando o que muitos filmes mostram, no caso de "Gomorra" bandido não investe em obras de artes, não compra roupas caras para a esposa e/ou amante e nem vive em uma casa chique. Os mafiosos italianos continuam sendo rudes e com mau gosto. Essa forma de encarar a "ascensão" é primordial para ter uma noção do que realmente o dinheiro representa para esses bandidos.

"Gomorra" é um filme que deixou a crítica bastante dividida. Não se pode esquecer que ele ganhou a Palma de Ouro no Festival de Cannes, o que representa um dos maiores reconhecimentos que um filme pode obter. Mas por outro lado, alguns críticos consideram que a idéia de "Gomorra" é excelente, mas pecou em ritmo e em uma ligação melhor do roteiro.


Ficha Técnica:

Gomorra (Gomorra)
Itália - 2008
Direção: Mateo Garrone
Produção: Domenico Procacci
Roteiro: Matteo Garrone, Roberto Saviano, Maurizio Braucci, Ugo Chiti, Gianni Di Gregorio e Massimo Gaudioso. Baseado no livro de Roberto Saviano
Fotografia: Marco Onorato
Trilha Sonora:
Elenco: Salvatore Abruzzese, Simone Sacchettino, Saltavore Ruocco, Vincenzo Fabricino, Vincenzo Altamura, Italo Renza, Gienfelice Imparato, Maria Nazionale
Duração: 137 minutos

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

A Noiva de Frankesntein



"A Noiva de Frankenstein" foi feito no período do que hoje é chamado de "Série Monstros" da Universal. Na mesma época foram filmados "Drácula", "Lobisomem", "Fantasma da Ópera" e muitos outros títulos. O estúdio conseguiu criar uma série de personagens que mexiam com o imaginário das pessoas e que podem ser considerados inspiradores para os filmes B. O fato é que essas produções, com todas as dificuldades da época, são base para muitos filmes atuais. Não é por acaso que de vez em quando os grandes estúdios investem em títulos como "A Múmia", "Lobisomem", releituras de "Fantasma da Ópera" e outros.

Na verdade, esse "estilo" de filme fez muito sucesso na época também. O melhor exemplo disso é "A Noiva de Frankenstein", que continua a estória do monstro criado com pedaços de seres humanos. E um fator curioso que o estúdio apresentou na época foi a confusão gerada pela verdadeira "noiva" da personagem. Muitas pessoas esquecem que Frankenstein é o criador e não a criatura, logo, de quem seria a noiva? Do doutor ou do ser que ele criou? Até mesmo quando o filme foi lançado, havia uma interrogação ao lado do nome da atriz que interpretava a personagem que dá nome ao filme.

O Dr. Pretorius (Ernest Thesiger) não consegue convencer o Dr. Frankenstein (Colin Clive) a criar uma nova vida artificial. Até que Pretorius encontra o Monstro (Boris Karloff) e eles sequestram a noiva do Dr. Franskenstein, fazendo com que ele aceite a nova missão: criar uma companheira para o Monstro. Na continuação, o Monstro é uma personagem mais humana; ele passou muito tempo convivendo com um velho cego que o "ensinou" alguns hábitos humanos. O Monstro passa a ter, até mesmo, vícios: ele fuma, bebe e resmunga algumas palavras. Mas como no primeiro filme, ele continua sendo uma pessoa incompreendida e julgava pela aparência assustadora que tem.

"A Noiva de Frankenstein" foi muito bem aclamado pela crítica e é considerado como um dos melhores filmes do gênero da história. Mas, como a maioria das continuações, ele não conseguiu superar o primeiro filme da série e parece que foi realizado apenas porque "Frankenstein" deu muito certo, ou seja, lucro para o estúdio. Tudo bem que o final da primeira produção dá espaço para mais uma estória, mas não era necessário. É um filme razoável e não muito marcante; até porque a espera pela figura da companheira do Monstro é longa e não muito recompensadora. Para aqueles que gostaram do primeiro filme, o de 1931, vale a pena assistir para ver a continuação que os roteiristas deram ao filme, mas só por isso.



Ficha Técnica:

A Noiva de Frankenstein (Bride of Frankenstein)
Estados Unidos - 1935
Direção: James Whale
Produção: Carl Laemmle Jr
Roteiro: William Hurlbut e John L. Balderston. Baseado na obra de Mary Shelley
Fotografia: John J. Mescall
Trilha Sonora: Franz Waxman
Elenco: Colin Clive, Boris Karloff, Valerie Hobson, Ernest Thesiger, Elsa Lanchester, Gavin Gordon, Douglas Walton, Una O'Connor, Lucien Prival, O.P Heggie, Reginald Barlow, Mary Gordon, Ted Billings
Duração: 71 minutos

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Possessão




"Is it desire? Or violation? Devotion? Bondage? Your hidden fears will be around"



"Possessão" é o tipo de filme que é preciso ter muito cuidado sobre o que falar. Qualquer exposição de detalhes pode prejudicar o impacto da obra sobre a platéia. Por isso, a sinopse é apenas esta: Mark (Sam Neill) volta de viagem e descobre que sua esposa Anna (Isabelle Adjani) está tendo um amante. Por esse e outros motivos o casal embarca em uma grande crise no relacionamento. "Possessão" serve para mostrar que, mais uma vez, no cinema não é importante O QUE você conta, mas COMO se conta. Daí o grande mérito do diretor que, nesse filme, em especial, teve função determinante.

É curioso ver que alguns críticos classificaram "Possessão" como um filme de terror. É certo que cada um tem suas interpretações acerca de qualquer obra e que a partir do momento em que um filme, um livro, uma propaganda... são expostas ao público, cada um fica livre para interpretar como quiser. Sendo assim, "Possessão" pode ser classificado como um dos dramas mais densos da história do cinema. A trama é um drama de casal, de amor obsessivo e de psicose sexual. É aquele tipo de relação que o fim não pode chegar, mas por razões saudáveis é preciso que ele acabe. "Possessão" trata do amor carnal, do desejo e dos pensamentos mais íntimos das duas partes de um relacionamento.

Após assistir o filme é impossível não comparar vários elementos e a abordagem do diretor Andrzej Zulawski com o estilo de David Lynch. As loucuras de Lynch, a obscuridade, os pequenos detalhes que fazem a diferença... tudo está presente em "Possessão". E assim como o próprio Lynch falou "alguns filmes são para ser sentidos, não entendidos". É normal que o espectador passe o filme inteiro sem entender várias partes e o motivos de certos elementos estarem presentes, mas quando "Possessão" vai acabando e todos estão envolvidos pela atmosfera densa do filme, cada pedacinho da obra vai se juntando - até os detalhes mais monstruosos. Sentir o drama do casal, se colocar na situação e entender o que significa essa psicose de marido e mulher vale mais que se aborrecer por não acompanhar os elementos adicionados pelo diretor.

Há rumores de que o casamento de Andrzej Zulawski tenha sido inspirador para "Possessão"; talvez por isso alguns detalhes sejam tão difíceis de entender, pode ser que o diretor tenha adicionado pensamentos e sentimentos próprios para deixar tudo mais denso. Por esse motivo a direção de Zulawski foi o elemento mais importante para que "Possessão" fosse um dos filmes mais diferentes e complexos já realizados. Na cena em que Anna aborta é possível perceber que ela foi filmada de uma só vez, ou seja, não existem cortes. A atuação de Isabelle Adjani é perfeita. Principalmente nessa cena do aborto, que é uma das mais marcantes e inesquecíveis do filme. A atriz sabe quando ponderar e quando deve exagerar e enlouquecer. Talvez por isso sua atuação seja mais marcante que a de Sam Neill. Parece que ela como o lado feminino da relação e como personagem mais enigmática chama mais atenção que o marido. Mas Adjani está perfeita no papel, se o filme fosse feito de novo não seria necessário mudar nada do que ela fez.

É preciso ter muita paciência com "Posessão": seja para acompanhar o ritmo meio lento do filme, para encarar os surtos do casal e para assistir a maioria das cenas que são bastante pesadas. Se o espectador conseguir chegar ao final do filme não vai ser uma experiência perdida e vai ser possível assistir uma das mais diferentes e complexas produções do cinema.


Ficha Técnica:

Possessão (Possession)
França/Alemanha - 1981
Direção: Andrzej Zulawski
Produção: Marie-Laure Reyre
Roteiro: Andrzej Zulawski e Frederic Tuten
Fotografia: Bruno Nuytten
Trilha Sonora: Andrzej Korzynski
Elenco: Isabelle Adjani, Sam Neill, Heinz Bennet, Margit Carstensen, Michael Hogben, Joanna Hofer, Carl Duering, Shaun Lawton, Miximiliam, Rühtlein, Thomas Frey, Leslie Malton, Gerd Neubert
Duração: 123 minutos

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

O Mensageiro do Diabo




O reverendo Harry Powell utiliza seu carisma e a religião para conquistar as pessoas os seu redor. Mas na verdade, Harry Powell é um golpista que se aproveita da fragilidade de jovens viúvas para tirar todo o dinheiro deixado pelo marido para eles. A mais nova vítima do reverendo é Willa Harper (Shelley Winters) que viu seu marido morrer enforcado, acusado de assassinato. "O Mensageiro do Diabo" tem uma trama bastante simples, mas toda a atmosfera criada ao redor da situação e as polêmicas propostas pelo roteiro fazem toda a diferença no que poderia ter sido mais um filme de suspense/terror.

A questão do filme é toda psicológica. Em nenhum momento se vê sangue, tiros, fantasmas e outros elementos comuns dos filmes do gênero. Robert Mitchum consegue deixar os espectadores desesperados apenas com palavras, olhares e subjetividade. Talvez "O Mensageiro do Diabo" seja um filme bastante a frente do seu tempo; é fácil imaginar o problema que um filme que critica a religião o tempo todo pode ter causado nos anos dourados. O fato é que os ensinamentos católicos e evangélicos são postos à prova em todo momento. Começando pelo ditado que pode resumir o filme inteiro: Harry Powell é "lobo em pele de cordeiro". A distância dos filmes da época ficam mais evidente quando pensamos que enquanto "O Mensageiro do Diabo" propunha uma estética diferente, temas e abordagens diferentes, os grandes estúdios filmavam "Ladrão de Casaca" e "O Pecado Mora ao Lado", ambos ótimos filmes, mas que pouco provocavam o público.

A única direção de Charles Laughton - que ficou arrasado com as críticas de "O Mensageiro do Diabo" e nunca mais realizou nenhum outro filme - foi cheia de referências e homenagens. É fácil perceber a influência do movimento expressionista e várias características do filme noir (sendo a mais óbvia, todo o clima gerado em torno do reverendo e o jeito com que o diretor utiliza as sombras e as luzes para dar um toque especial ao filme). Mas se a única direção de Charles Laughton só foi reconhecida como obra de arte muitos anos depois, um ponto em que todos chegam a concordar é a inesquecível atuação de Robert Mitchum. O reverendo Harry Powell já está ao lado de grandes personagens do cinema. Ele consegue transmitir toda maldade, crueldade e, ao mesmo tempo, carisma que os piores - ou melhores - vilões possuem.

Apesar de todas as qualidades, "O Mensageiro do Diabo" não deixa de ter problemas. O roteiro, por exemplo, é um deles. A insistência na "cegueira" das pessoas que cercam a vida do reverendo, em não ver sua verdadeira personalidade é o principal defeito. Apesar de ser convincente, a personagem dá diversas pistas de que não é a bondade que todos veem. A insistência chega até a ser um pouco irritante. Outro defeito é a atuação da pequena Sally Jane Bruce, que interpreta Pearl Harper, a garotinha que acredita cegamente no reverendo. Fora esses problemas, "O Mensageiro do Diabo" é um filme muito especial e bastante à frente do tempo em que foi filmado. E é uma raridade também: o filme chegou a pouco tempo em DVD e vale a pena ser visto.


Ficha Técnica:

O Mensageiro do Diabo (The Night of the Hunter)
Estados Unidos - 1955
Direção: Charles Laughton
Produção: Paul Gregory
Roteiro: Davis Grubb, James Agee, Charles Laughton
Fotografia: Stanley Cortez
Trilha Sonora: Walter Schumann
Elenco: Robert Mitchum, Shelley Winters, Lilian Gish, Evelyn Varden, Peter Graves, Billy Chaplin, Sally Jane Bruce, Gloria Castillo
Duração: 93 minutos

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

A Criança



A Criança é um filme, no mínimo, muito interessante. Os irmãos Dardenne, já famosos por levar a realidade para o cinema, conseguiram retratar vários assuntos polêmicos em apenas um filme: a gravidez na adolescência, a marginalização dos jovens, a moral e a ética. Sônia (Débora François) e Bruno (Jérémie Rénier), com 18 e 20 anos respectivamente, são namorados e tem um filho não planejado. O pai vive de pequenos roubos e a mãe tenta sobreviver com uma pensão dada pelo governo, enquanto está à procura de emprego para sustentar o filho. A partir do nascimento da criança, os dois começam a ver o bebê de maneiras diferentes: a mãe quer fazer de tudo para dar uma vida digna à família e o pai pensa em usar o filho para conseguir mais dinheiro.

Com essa temática simples, o filme poderia ter sido mais um romance entre os milhares que o cinema já possui. Mas o roteiro e a direção dos irmãos Dardenne fazem toda a diferença. Eles procuram aproximar ao máximo o filme da realidade, seja na interpretação dos atores, seja na utilização do som: eles captam as buzinas, o barulho dos carros na rua, o som de moedas e todos os ruídos que compõe uma cidade. E apesar dos atores Débora François e Jérémie Rénier estarem ainda no início de carreira (na época do filme), a química entre os dois e a atuação comprometida com a realidade consegue aproximar ainda mais o espectador da vida conturbada do casal. Mas o verdadeiro destaque é o ator Jérémie Rénier como o pai irresponsável e imaturo. Ele se sai muito bem. Rénier consegue despertar no espectador sentimentos de raiva e de pena. Afinal, ele é um pai jovem e ainda não tem experiência em cuidar de alguém.

Mas o que é crucial para a diferenciação de A Criança de qualquer outro drama ou romance é o não-julgamento das personagens. Os diretores não estão interessados em avaliar o comportamento da família. Ele deixa essa tarefa para o espectador. A direção apenas mostra os fatos e deixa que cada um tome suas próprias conclusões. Até porque mesmo com toda a inexperiência da mãe e do pai, e com as frequentes brigas, eles não conseguem viver separados. Mesmo sem conhecer nada da vida, eles precisam um do outro para continuar seguindo em frente.

Apesar de não ser um filme ágil e com ritmo intenso, A Criança é um grande filme atual porque retrata, justamente, os problemas enfrentados pelos jovens hoje em dia: a gravidez precoce, seguida pela perda da inocência e a falta de esperança em um futuro melhor. A Criança ganhou a Palma de Ouro no Festival de Cannes e foi muito merecido. É interessante ver o que o cinema belga/francês conseguiu fazer com um roteiro, aparentemente, simples. Eles transformaram mais uma estória de gravidez na adolescência em um filme cheio de questionamentos.

Ficha Técnica:

A Criança (L'Enfant)
Bélgica/França - 2005
Direção: Jean-Pierre Dardenne e Luc Dardenne
Produção: Denis Freyd, Jean-Pierre Dardenne e Luc Dardenne
Roteiro: Jean-Pierre Dardenne e Luc Dardenne
Fotografia: Alan Marcoen
Trilha Sonora:
Elenco: Jérémier Renier, Déborah François, Jérémie Segard, Fabrizio Rongione, Olivier Gourmet, Mireille Bailly, Jean-Michel Balthazar, Stéphane Bissot, Frédéric Bodson, Olindo Bolzan
Duração: 95 minutos